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América do Sul: Os desafios da instabilidade política e o papel do Brasil na região
Os países da região enfrentam sérias crises de segurança e instabilidade. Facções criminosas, violência e colapsos institucionais são desafios iminentes.
O início de 2024 trouxe consigo uma crise de segurança no Equador. Depois que uma universidade em Guaiaquil e uma emissora de TV local foram alvo de invasões por parte de homens armados munidos de revólveres e bombas. Esses ataques aconteceram apenas dois dias após a fuga do líder dos Los Choneros, uma das facções criminosas mais temidas do país, da prisão onde cumpria uma pena de 34 anos.
Mais um incidente de iminente colapso tem sido registrado em países da América do Sul, incluindo o Brasil, que em 8 de janeiro de 2023 foi palco de uma série de ataques contra as instituições de poder, gerando uma real preocupação com a possibilidade de um golpe.
América do Sul em Crise: Contexto e Origens
Apesar de igualmente preocupantes, as crises que envolvem países como Brasil, Venezuela, Equador e Argentina possuem diferentes origens, mas o contexto mostra que a América do Sul não vive seus melhores momentos em questão política, de segurança e econômica.
Brasil, um líder?
O Brasil, que já atuou como intermediário nos diálogos entre Venezuela e Guiana e fez uma megaoperação conjunta com a polícia do Paraguai contra o tráfico de armas se apresenta como um importante ator para manter o equilíbrio regional.
Logo no início do seu mandato, o presidente Lula (PT) convidou os presidentes da América do Sul para um encontro no Itamaraty e lançou 10 propostas para o progresso da região, focando na economia, meio ambiente e energia.
Na área da segurança, por exemplo, a proposta é de uma maior cooperação nas áreas de indústria militar, doutrina e políticas de defesa, com formação e treinamento.
Veja, abaixo, quais as principais crises de cada país da região.
💣 Equador
A crise no Equador, que começou com motins em prisões, faz parte de uma onda de violência que vem tomando conta do país desde agosto de 2023, quando a eleição presidencial que deveria ocorrer apenas em 2025 foi antecipada após a dissolução da Assembleia Nacional.
Em agosto, às vésperas da votação, Fernando Villavicencio, um dos candidatos à presidência, foi morto a tiros à luz do dia ao sair de um comício.
Após a fuga de José Adolfo Macías Villamar, conhecido como Fito, chefe de facção criminosa, da prisão, no último domingo (7), o governo do Equador decretou estado de exceção. Na terça-feira, criminosos tomaram as ruas, promoveram sequestros e invadiram uma emissora de TV, colocando uma arma na cabeça de um apresentador.
O presidente Daniel Noboa então declarou 22 grupos como terroristas e criou um decreto de conflito armado interno, o que na prática caracteriza os criminosos como terroristas e libera o Exército e a Polícia Nacional a agir.
A situação do crime organizado no país se modificou nas últimas décadas, como explica o comentarista Guga Chacra, da GloboNews.
‘No passado não se falava em cartéis e crimes organizados no Equador… Não podemos nos esquecer que o Equador faz fronteira com os dois maiores produtores de cocaína do mundo: a Colômbia o Peru. O Equador acabou entrando na roda e se tornando um grande centro para o envio dessa droga em direção aos EUA e para a Europa’, diz Guga, ressaltando a participação de grupos criminosos do Brasil e da Europa nesse processo de tráfico internacional de drogas.
Em entrevista ao Edição das 18h, da GloboNews, o professor de Relações Internacionais da FGV/SP, Oliver Stunkel, explicou que o colapso do sistema carcerário é outro problema grave que culminou na crise equatoriana e que a instabilidade dificilmente será resolvida rapidamente.
Segundo ele,a situação do Equador mostra que o crime organizado da América do Sul ‘busca países menos protegidos e mais vulneráveis’. O Equador, segundo o especialista, foi identificado pelo narcotráfico como um país útil para exportar a cocaína.
💣Argentina
A Argentina vive uma situação diferente de países como Venezuela e Equador. O país vizinho ao Brasil enfrenta há anos uma profunda crise econômica com reflexos na política. A expectativa mais recente aponta que a inflação mensal da Argentina deve subir para 28% em dezembro, segundo projeções. Caso se confirme, essa será a maior taxa em um mês desde o início de 1990.
A previsão de forte alta no índice de preços vem em meio ao cenário desafiador que o país enfrenta, com uma inflação anual que deve chegar a 200%, uma das mais altas do mundo.
Para tentar conter as crescentes crises, o novo presidente argentino, Javier Milei, enviou ao Congresso um pacote com mais de 600 artigos declarando emergência pública e econômica até 2025. Milei ainda propôs mudanças nas eleições.
As medidas polêmicas geraram ondas de protesto em várias cidades argentinas e confrontos com a polícia.
💣 Venezuela
Questionamentos sobre a democracia rondam a Venezuela há muitos anos e a população do país sofre com sanções econômicas. No campo político, em outubro do ano passado o Ministério Público (MP) emitiu um mandado de prisão contra o opositor Juan Guaidó, que chegou a se autoproclamar presidente do país em 2019.
Na ocasião, Guaidó foi reconhecido pelos governos do Brasil e Estados Unidos, entre outros.
Maduro voltou a acusar os EUA de liderarem complô contra o regime chavista. Há mais de 20 anos o país atravessa uma crescente crise política, econômica e social, que resulta em um êxodo cada vez maior de venezuelanos.
Em 2023, a Venezuela se envolveu em uma crise internacional ao tentar anexar a região de Essequibo, o que gerou uma crise em outro país da América do Sul. A situação ficou menos tensa quando Maduro e o presidente da Guiana, Irfaan Ali, se encontraram, em evento mediado pelo Brasil, e acertaram a proibição do uso de força.
💣 Guiana
Em dezembro de 2023, os venezuelanos rejeitaram em referendo a jurisdição da Corte Internacional de Justiça sobre a longa disputa territorial do país com a vizinha Guiana e apoiaram a criação de um novo estado na região de Essequibo.
Localizado na parte mais a oeste do território da Guiana, a região de Essequibo ocupa 159 mil km² e representa cerca de 70% do território do país. Em 2015, foram encontradas grandes reservas de petróleo na região.
Estima-se que na Guiana haja o equivalente a 11 bilhões de barris, parte significativa deles ‘offshore’, ou seja, no mar, perto de Essequibo. Em consequência do boom do petróleo, a Guiana é o país sul-americano cuja economia mais cresce nos últimos anos. A situação ficou menos tensa quando Maduro e o presidente da Guiana, Irfaan Ali se encontraram, em evento mediado pelo Brasil, e acertaram a proibição do uso de força.
💣Brasil
A maior crise institucional do Brasil nos últimos anos aconteceu em janeiro de 2023, após derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas urnas. Apoiadores golpistas de Bolsonaro que não aceitaram o resultado das eleições invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília.
Na ocasião, o país vivia sob a tensão de acampamentos golpistas em frente a quartéis do Exército. Em um dos maiores ataques à democracia em décadas, o governo brasileiro precisou fazer um acordo com generais do Exército para desmobilizar o acampamento onde estavam concentrados os golpistas.
Um impasse, no entanto, levou as tropas da polícia do Exército e da Polícia Militar, a ficarem frente a frente próximo ao quartel.
Detalhes deste dia que já está na história brasileira foram relatados no documentário ‘8/1: A Democracia Resiste’, da GloboNews, lançado no último domingo (7).
💣 Chile
O Chile viveu uma efervescência política em 2019, quando o então presidente Sebastian Piñera chegou a solicitar que ministros coloquem cargos à disposição. Naquele ano, o governo anunciou o aumento na tarifa do metrô, gerando uma onda de protestos que culminou em ‘Estado de Emergência’.
O Exército foi às ruas do Chile pela 1 ª vez desde a ditadura e o governo suspendeu o aumento.
No fim de 2021, o candidato de esquerda Gabriel Boric foi eleito presidente do Chile. A principal polêmica do novo governo, até agora, foi a proposta de mudança constitucional via plebiscito.
Em duas ocasiões, os chilenos rejeitaram uma substituição ao texto atual, que é da ditadura de Augusto Pinochet. A tentativa de mudança constitucional veio após os protestos de 2019.
💣 Colômbia
Os colombianos tentam há anos se livrar dos traumas do comando do narcotráfico no país. Houve um fortalecimento do Estado, mas o país vive em constante estado de alerta por conta do histórico de conflitos armados que teve o auge nos anos 1990.
Em um dos episódios mais recentes da violência colombiana, o pai do jogador de futebol do Liverpool Luis Días foi sequestrado pela guerrilha do Exército de Libertação Nacional (ELN). Ele ficou mais de uma semana sob o poder dos criminosos.
O sequestro, segundo o governo, foi uma tentativa do grupo armado de arrecadar fundos, mas interrompeu diálogos de paz que o ELN, grupo que já matou 450 mil pessoas em 60 anos de atuação, travava com o governo da Colômbia desde o ano passado.
Em agosto, a morte de Fernando Villavicencio, candidato à presidência do Equador, foi associada também a um grupo colombiano.
A presença de colombianos em crimes contra políticos de outros países não é uma coincidência, segundo pesquisadores que estudam a Colômbia. O país teve décadas de conflitos com diversos grupos, e uma parte deles se especializou e passou a atuar fora do país.
💣 Peru
O Peru é mais um país da região que vive uma sequência de crises institucionais. A atual presidente Dina Boluarte chegou ao poder depois que o Congresso aprovou o impeachment de Pedro Castillo. Ele foi destituído após uma tentativa de dissolver o Legislativo e decretar estado de exceção e toque de recolher no Peru.
Em 2023, milhares de pessoas foram às ruas em cidades peruanas para pedir a saída da presidente Boluarte. Dezenas de manifestantes morreram nos graves confrontos com forças de segurança.
💣 Bolívia
A crise política também se faz presente na Bolívia. Por lá, o Tribunal Constitucional Plurinacional da Bolívia(TCP) inabilitou o ex-presidente Evo Morales como candidato à Presidência em 2025. A Corte anulou o mecanismo da reeleição indefinida que já havia permitido ao líder indígena recandidatar-se em 2019.
No meio do ano passado, Morales chegou a anunciar sua candidatura em meio à crescente tensão com o governo de seu ex-parceiro político, Luis Arce.
Com chutes, socos e puxões de cabelo, parlamentares governistas e da oposição na Bolívia se enfrentaram em uma sessão pública do Parlamento em maio do ano passado. A confusão ocorreu por causa de um relatório sobre a prisão do governador da região de Santa Cruz, principal nome da oposição no país.
💣 Paraguai
Os paraguaios não vivem a mesma efervescência política do que seus vizinhos, mas o país também sofre com um problema quase que generalizado na América do Sul: a corrupção.
Em um dos casos mais recentes e que tem ligação direta com o Brasil, a polícia apreendeu, 1,8 mil armas na megaoperação contra o grupo comandado pelo maior traficante de armas da América do Sul, Diego Dirisio.
Na Dimabel, órgão paraguaio responsável por controlar, fiscalizar e liberar o uso de armas, os investigados ocupam cargos de tenente, general, coronel e capitã.
💣Suriname
O menor país da América do Sul também passou por distúrbios recentes. Em fevereiro de 2023, um protesto contra o alto custo de vida resultou em distúrbios na capital Paramaribo, que foram dispersados pelas forças de segurança em meio a saques de comércios e à tentativa de invasão do Parlamento.
Entre 1.000 e 2.000 pessoas se reuniram pela
Fonte: G1 – Mundo